abril 20, 2012

Poker Night por Luís Filipe Borges




Por muitas voltas que dê, não me consigo lembrar das razões – certamente determinantes – que me levavam a sair à noite. Há um tempo nas nossas vidas em que tal surge como uma obrigação mais do que um plano.
É sexta, é sábado, é ladies night, há uma festa, há música ao vivo, logo tem de ser. Quais seriam os motivos? Não era seguramente beber mais caro, encontrar o amor da nossa vida, perder anos de vida à procura de estacionamento, enfrentar filas para os sítios da moda, estar com os amigos. Talvez a última, embora a noite não seja exclusiva, monopolista desse território.
Claro que vivi noitadas memoráveis mas eram necessárias coincidências cósmicas de uma raridade extrema. Hoje em dia, tenho uma borga escrupulosamente planeada. A primeira terça-feira de cada mês é dedicada ao Poker, na variante Texas Hold’em. É fácil estacionar, não há pessoas aos gritos na rua, e a casa do nosso anfitrião não poderia ser mais acolhedora. Cada amigo entra com 10 euros ao início do serão, convertidos em fichas coloridas que, sobre a mesa e simbolicamente, vestem-se de milhares, milhões. Mandam-se vir pizzas, há cábulas com as sequências vencedoras a circular, e uma discussão eterna sobre a música de fundo ideal para a jogatana: tem variado entre Tom Waits e Kanye West, com passagem por Snow Patrol – aliás, este ecletismo musical reflecte-se bem nas proveniências dos amigos à volta da mesa, de jornalistas a arquitectos, de escritores a modelos, argumentistas, actores. Cada conviva é incumbido de trazer bebidas, da singela mini ao ‘hard liquor’. Conversa-se, fuma-se, ri-se. Custam-me 10 euros estas noites onde esqueço todos os problemas – ainda não ganhei nada, tirando uns brilharetes de principiante envolvendo mãos de full house e flush. Um preço bem económico para ser feliz.
O serão tem hora de término marcada, por isso duplicam-se as apostas 15 minutos antes da uma da manhã. Posto isso, e religiosamente, ficamos um pouco refastelados na sala, discutindo serenamente estratégias e bluffs. O vencedor do mês é pessoa para levar uns faustosos 40 euros para casa, destino comum a todos – sem porteiros, polícia, bêbedos e confusão avulsa ao barulho. Pois… na viagem de regresso, continuo sem me lembrar dos motivos pelos quais saía à noite.
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1 comentário:

TUBARAO23 disse...

Bom texto, para mim com o mais importante do poker, a amizade. Parece uma mesa que ás vezes se faz na Vacariça á 6ª feira.

Luis Filipe Borges convidado de um circo uma destas noites??