Meus amigos, conforme prometido, aqui fica a Crónica de quase tudo o que se passou ao longo de um fim-de-semana inesquecível. Como devem compreender, e sendo o Futsábado um espaço aberto, existem alguns detalhes vitais que não menciono, dado que envolvem questões estratégicas e nunca se sabe o dia de amanhã. Quanto menor informação dermos aos adversários, melhor. Mesmo assim, se tiverem alguma questão, ou acharem que é importante algum esclarecimento, podem usar a caixa dos comentários para dizerem de vossa justiça. Por mim, só posso agradecer uma vez mais o apoio de todos e expressar o meu reconhecimento por me terem feito andar nas nuvens esta semana. Como me dizia a Neuza "M1uda" Padrão no fim do torneio, sinto-me o "Rei da Cocada Preta". Até já acredito que um dia vou conseguir voltar a ganhar uma Copa FutPoker, imaginem vocês. Abraço e tudo de bom. Já agora, recordo-vos que podem ler todos os artigos relacionados com o Solverde
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Sexta-feira, 3 Outubro
Sit'n Go, Posição 5
Conforme combinado, saio da redacção e dirijo-me para Espinho, de onde o RugbyWolf já tinha começado a mandar sms. Com o trânsito, era impossível chegar às 21 horas, mas pouco depois lá entro no Casino. Mesmo via telemóvel não foi fácil dar com o nosso amigo escritor, com o qual estive fisicamente pela primeira vez. Feita a inscrição para uma sit'n go de 60€, estava reunido o cenário para um bom aquecimento com vista ao Solverde. Logo ali o Sérgio apresentou-me ao Hugo “Aliv3” Almeida e à Neuza “M1uda” Padrão, que viriam a ser dois pilares fundamentais para a força que fui tendo ao longo do fim-de-semana. Estávamos na sala de jogos quando apareceu o Jomané, o grande mentor do Pokerpt.com, jogador de póquer de alto nível e antigo praticante de basquetebol de primeiro plano. A conversa foi boa, tanto que, quando chegámos à sit, já a mesma decorria há 8 minutos. Estão livres os lugares 4 e 5. O Lobo abanca-se na 4 e, desta vez, sou eu que fico com posição sobre ele, ao contrário do que é costume nas Copas e Circos. O field não me parece nada de especial, mas de início limito-me a foldar e a perceber como as coisas vão andando. Isto até que chega big blind, vejo TT e aguardo por acção. Todos vão foldando, mesmo os jogadores que contava vir a defrontar, e o Lobo tenta dar uma espreitadela ao flop fazendo limp. Com par médio não estou interessado em ver cartas e, como era óbvio para todos que éramos amigos, nada como mandar ali uma mensagem de força: re-raise imediato e fold. Infelizmente, mais tarde, o Sérgio não teve paciência, pushou com uma mão marginal e foi afastado. Entretanto, o Malaco já tinha chegado ao Casino e foi acompanhando os acontecimentos, ele que é uma referência do póquer sólido e paciente (vulgo Poker Tântrico...) entre o plantel FutPoker. Fui fazendo alguns folds pouco habituais, mas fui-me soltando, ganhei uma corrida contra o jogador mais loose com 99 vs KQ e depois provoquei outro confronto com o elemento que tinha edge verbal sobre a mesa, e pelos vistos grande rodagem nos Solverdes, superando-o com 88 vs 44 e vingando a eliminação do RugbyWolf. Pensava eu que a sit apenas dava somente uma entrada para o Main Event quando, já depois de estarmos 3 handed, percebo que afinal havia payout e já tinha, pelo menos recuperado o buy-in. Maravilha. Ao meu lado estava um puto que sabia jogar, mas com estilo algo "geek", e o jogador que me agradava mais, também jovem, na posição 8. Comecei então a intervir psicologicamente quando a posição 6 decide ir all-in e eu espero até que ele ponha as fichas todas no centro da mesa, e eram muitas, para só então foldar, para espanto dele. Chega então a primeira jogada polémica do weekend. Recebo KK, estou short e, imaginem faço limp de quase metade da stack, dado que a estrutura super turbo não perdoava e, de facto, não me adaptei da melhor forma a esse ritmo na fase final da mesa. Os outros jogadores assustam-se, mas tinha olhado para a posição 8 e senti que ele tinha jogo. Cheirou-me a Ás e não quis correr. Vem um flop inócuo e faço all-in, com o referido jogador a reafirmar que eu tinha de “estar muito forte” e a foldar, virando AJ. Sim, ele teria pago a corrida, mas foi daqueles pressentimentos. Tal como um fold com KJ sem sentido nenhum, quando devia ter pressionado. Finalmente, vou KQ vs Q4 e, depois de toda a noite ter falado no “Momento Bwin”, sou eu que levo com 4 no turn e saio. Mas pronto, já estava a freerollar e o objectivo era mesmo aprender, ambientar-me às mesas e, nesse capítulo, foi uma oportunidade excepcional e que viria a fazer toda a diferença no dia seguinte. Recordo que se tratou da primeira experiência a jogar ao vivo naquele tipo de envolvência e logo frente a adversários com currículo na matéria. No final, e tendo em conta que os 60€ eram para ter ido pela janela fora, impunha-se pagar o jantar ao Lobo, o que acabou por acontecer no Galiza porque em Espinho, depois da meia-noite, parecia ser impossível encontrar onde comer. Isto, claro, depois de ligar ao Tuffboy85 para saber se havia alguma megaoperação policial em curso, não fosse o diabo tecê-las...
Sábado, 4 de Outubro
Etapa 9 da Solverde Season-Dia 1
Mesa 25, Posição 5
Tendo dormido/descansado bem menos do que seria ideal depois de uma semana difícil com o acompanhamento do Sp. Braga na Eslováquia a dar cabo de três noites de sono, era altura de voltar a Espinho para conhecer pessoalmente o Nuno “Petruzzi” Almeida. O local de almoço estava escolhido e o trio do Team FutPoker, já com o check-in feito na noite anterior, preparou-se para a batalha. Na entrada do Casino, começava o desfile de pessoal com óculos de sol, capuzes, camisolas e pólos de salas de póquer ou equipas/clubes da modalidade. Um cenário impressionante, e intimidante, para quem estava a fazer a estreia. Não havia maneira de encontrar o Marco “Shadow88” Hélio, repórter da RTP que esteve comigo em Bratislava, por isso lá fomos para a sala. Fui ao sorteio dos lugares e fiquei na mesa 25, logo junto à entrada, na posição 5, e depressa percebi que essa seria a primeira mesa a ser desfeita quando as eliminações começassem a ocorrer. O field não impressionava à primeira vista: dois sapinhos (um deles afinal tinha sido 12º no Betfair de Vilamoura...), um senhor de mais idade, mas de calções, na posição 10, e um elemento que conhecia das fotos do Pokerpt.com e que vim a saber ser o NjdSousa, o primeiro português no payout de um Aussie Millions. Mais tarde, percebi que, na outra ponta estava Davide “Davidoff” Barbosa, que foi bolha da final table. Ao meu lado ficou Humberto Viegas, um senhor brasileiro também conhecido dos Solverdes e, já com a mesa em andamento, sentou-se ao meu lado direito o maior pesadelo da tarde: Angélica “Angelonly” Vicente, elemento da equipa feminina Nutsbusters que descobri na segunda-feira ser a líder do Ranking do Poker de Damas. Bem, como estava confiante da noite anterior, e dado que a mesa me parecia acessível, tentei jogar mais solto. Vejo QT sem ninguém na mão e raiso. Levo dois calls e o flop trouxe AKx. Fico em str8b draw e beto, mas levo re-raise de um jogador com boa postura na posição 7. Penso e largo, claro. A seguir, raiso com KJ. O flop trouxe cartas baixas e checko. Humberto Viegas beta 200 e eu faço insta re-raise para 500. Ele larga. Primeiro objectivo alcançado: uma mão ganha na Solverde Season. Pouco depois, AQ suited. Raiso mil e levo um call. O flop vem com Qxx e quero matar a acção ali: beto 1k e levo call imediato. Sinal de alarme: olho para o senhor, para os dois ouros na mesa e leio flush draw. O turn trás outra carta de ouros e ele checka. Tive a certeza da tramóia. Checkei atrás. Bate Ace no river e ele faz all-in. Sorrio e foldo virando a Queen e ele mostra os dois ouros. Tendo começado com 5k de fichas em níveis de 35 minutos, e estando reduzido a 2.825, decidi esperar pelo addon de mais 5k por 50€ para voltar à acção. Mesmo assim, ainda tive 2 ou 3 situações em que a posição e o jogo pareciam promissores, mas a Angélica nem me deixava respirar. Dominou por completo a mesa, com agressividade e cartas fortes. Em relação à "Angelonly", a quem agradeço ter sido um factor de inspiração através da sua simpatia ao longo do weekend, cometi o erro de ter desempenhado o papel de estreante deslumbrado com o ambiente. Não afirmei uma imagem forte na mesa e, quando dei por mim, estava manietado. E, até, acabando por ajudar à supremacia da Angélica ao insistir que “não se dá call a uma senhora” para pressionar os outros elementos. Serviu de lição e não voltou a acontecer. Veio o primeiro intervalo, o resto do pessoal FutPoker estava a safar-se. Não muito tempo volvido, a mesa foi desfeita já depois do addon, que me deixou com 7725 fichas. Ao entregar os recipientes de plástico para transportar as fichas, o Jomané referiu-se aos “pobrezinhos” que podiam levá-las na mão ao ver a minha stack. A expressão nem foi depreciativa, mas ficou-me gravada. Viria a ter resposta mais tarde. Balanço positivo da mesa: análise dos erros de abordagem psicológica cometidos e as boas leituras que me levaram a folds oportunos, sem desperdiçar mais fichas.
Mesa 13, Posição 5
Entregam-nos os tickets para escolher nova mesa e fico triste porque a Angélica tira a mesa 22, o meu número da sorte, tocando-me a mim a mesa 13, número mais ligado ao azar. Vou aproximando-me do local e, por dentro, fico praticamente em pânico: tinha de ir-me sentar, imaginem, ao lado do Kinas, o primeiro português a chegar ao money nas WSOP. Isso diz tudo. Olho para as posições 9 e 10 e vejo o Hencus e o João Manzarra, jogadores oficiais da Bwin. Posições 7 e 8 dois tipos com pinta de players, capuzes e auscultadores, um deles vim a saber ser o Nuno Brandão, actor dos Morangos com Açúcar. Na posição 6 estava o que vim a descobrir nas fotos ser o Johnny Guitar, jogador conhecido ao vivo e na net. Na posição 1 estava o Joaquim “JJBluffer” Dias, que chegou à final table. Nas 2 e 3 dois jovens, um deles descobri ontem que tem um blogue de poker e joga bastante cash, com lucro, o que exige perícia. Sento-me e vejo que estou no mesmo lugar da sit de sexta-feira. Ao menos isso a mesa da morte tinha de positivo. Primeira acção que vejo é um incrível duelo entre o JJBluffer e o Kinas, com este a dar um call do outro mundo do river depois de pensar 10 minutos e a desmascarar um bluff incrível do adversário que disparou barris sucessivos em str8 draw sem completar a mão. De estarrecer qualquer um, quanto mais um novato. Vêm as primeiras cartas para a mão e vejo JJ. Raise, re-raise do Johnny Guitar e call do João Manzarra, apresentador do Curto Circuito da SIC Radical. Sinto e vibe e nem penso duas vezes: all-in. O Johnny passa-se dos carretos a dizer que não podia largar e os dois jogadores da Bwin riem-se. Percebi que estavam fortes, mas comecei logo a disparar. “Quero ser eliminado por um gajo da televisão”, “só jogo na Bwin com o meu pessoal” e “ontem estive neste lugar, numa sit, passei toda a noite a falar no Momento Bwin e eu é que levei com ele”. O Hencus pergunta-me se também tenho ases e vi logo o filme, mas não tive dúvidas por um momento do que iria acontecer. O Johnny larga AQ e o Manzarra, sorridente, vira AA. O flop vem com blanks e o turn oferece-me o ansiado Valete. Hooligato ataca no Solverde!!!
A partir daí, tive direito a várias horas de aulas de póquer. Estar ao lado do Kinas foi fantástico. Soltei-me e comecei a manobrar psicologicamente, ao ponto de vender a ideia de que estava picado com o “professor”, quando na verdade fiz tudo para evitar o confronto. No segundo intervalo estava com 16k e acima de média. Depois, com AK suited, decido raisar. Levo dois calls. Flop com Jxx e vou a pegar em fichas para betar quando o Nuno Brandão faz o mesmo. Olho, ele vê que eu vi, largo e checko. Ele temo o check-raise e checka também. O jovem da posição 2 checka atrás. Bate Ace no turn e já tou com a corda toda: all-in. O Nuno passa-se, tenta tirar informação mas só leva com força em cima. Larga A6, a que seria a melhor mão. O outro jovem comete um erro e dá call com AQ. Salto para as 29,6k e fico com o ego inchado, quase apetecendo beliscar-me. Porém, sabia que tinha de continuar focado. Vem AA, raiso 3 bb's e todos foldam. Com um jogador novo ao meu lado, mas que também conhecia das fotos do Pokerpt, raiso 3 bb's com uma das minhas mãos preferidas e digo “standard raise”. Ele não me conhecia e apalpa-me o pulso com re-raise para 8 ou 9k. Os re-raises foram o aspecto para o qual mais me preparei antes do Solverde e, como o pote já estava bom, nem hesitei: all-in. Ele pensa e larga, claro. Vou para 38,3k e tenho quase o triplo da média. Com mais algumas jogadas, entre as quais um KK vs AJ, cheguei a ter 52k, sendo chip leader da mesa perto do Kinas e impondo respeito. Aliás, no online isso nunca foi referido, mas nessa fase era mesmo uma das maiores stacks do torneio. Entretanto, a mesa foi recheada de peripécias e polémicas: a dealer deixou 3 cartas na posição 1, depois tirou-lhe as cartas durante um all-in, depois havia uma espanhola que protestava por tudo e por nada. Resultado: o director do torneio passou ali metade da tarde, teve decisões muito difíceis para tomar e todas as jogadas foram de uma intensidade tremenda. Até que a mesa foi desfeita e o staff até deve ter respirado de alívio. Factor de motivação foi ainda, do meu lugar, ver que o Petruzzi continuava em acção, mesmo sem ter feito addon numa mesa de tubarões: grande jogo, camarada.
Mesa 8, Posição 1
Tiro o ticket para a mesa 8, posição 1. Vou a chegar e vejo o Shadow88 e, imaginem, o TCMoreira, o português que poucos dias antes tinha chegado ao money nas WSOPE, em Londres, jogando agressivo contra pesos pesados como John Juanda ou Mike Matusow. Também estava lá Ernesto Oliveira, que viria a ficar ITM. O facto é que passei por uma verdadeira guerra de nervos. Primeiro não vinha nada. Depois, com antes e as blinds a subir, havia jogadores a começar a mandar a stack toda para a frente. Foram quase 3 horas, ou mais, sem conseguir jogar, mas a fazer bons folds com boas leituras dos outros jogadores, nunca entrando em desespero. O nosso amigo Shadow fica pelo caminho quando a sua mão preferida, 88, não se aguenta, e eu lá continuo no fold/fold/fold, mas a resistir à tentação de jogar pares baixos e ases fracos pelos quais sou conhecido noutras paragens. Há um intervalo e a Neuza “M1uda” Padrão diz-me que vai dealar para a mesa 8. Espectáculo. Senti logo boa vibe. De início, não se materializou, mas mantive-me confiante. Chega o jantar e, imaginem, o Team FutPoker está sem baixas. Espectacular. Come-se, fala-se e rapidamente é hora de voltar à luta, Sento-me e a toada não muda. O Petruzzi entretanto é eliminado e vem dar-me apoio. Informa-me, depois, que o RugbyWolf também tombou: uma pena, dado que esteve sempre com boa stack e ameaçava ir longe. Somos informados que a mesa vai fechar: fico feliz por continuar vivo quando estavam cada vez menos mesas activas e, na derradeira mão, olho e vejo QQ. Nem hesito: all-in, pensando mais nas blinds e nas antes. Quando vejo um call nem acredito. O adversário vira AJ e estive sempre confiante que a overcard não viria. Confirmou-se e saio de lá carregadinho de fichas, acho que para aí 80k, o que reforçou a boa onda.
Mesa 1, Posição 7
Toca-me a mesa 1 e a Neuza diz-me que é bom, dado que essa mesa não voltaria a ser desfeita. Sento-me e a minha stack inspira algum respeito. Encontro vários jogadores patrocinados: Sérgio “Vgeta31” Almeida e Hugo Vinagre, da KK Poker, bem como o Alexandrino “Arkitekt” Caldeira, da Nuts. Ao meu lado estava o Tacuara, do fórum Pokerpt, vim a saber depois. O Davidoff tinha posição sobre mim e, logo a seguir estava... o TCMoreira (jogador Betfair ainda com os 25 mil euros das WSOPE fresquinhos no bolso...). Ou seja, mais um lago de tubarões. O Vgeta era o elemento mais expansivo verbalmente, representando o papel de maníaco mas, por isso a tornar-se mais perigoso. As blinds sobem, estou com 65k e vejo AA. Há raise do Vinagre e all-in do Manuel Costa com 17k. Tenho um mau pressentimento e peço tempo. Não posso foldar AA contra um short, mas passou-me de tudo pela cabeça. Se fosse uma stack maior do outro lado, não sei mesmo o que teria decidido. Assim, dou call e o vilão mostra 89 ouros. Soube logo que estava batido. Two pair no turn e full house no river. No comments. Na mesa sou acusado de fazer filmes, de ter tentado enganar, o Vinagre diz que queria atraí-lo para o pote mas, para fomentar a polémica, assumo que pensei em foldar e faço com que a discussão ande à minha volta. Ou seja, somo pontos em termos psicológicos. Foi então que um jogador com cara de poucos amigos chegou à posição 10 carregado com mais de 100k, chamando a atenção dos restantes elementos. Logo a seguir, faz uma pressão de cortar à faca sobre o Arkitekt, que mesmo atrás dos seus óculos de sol com grande estilo deixava transparecer o receio, foldando. Adorei a postura do que vim a saber ser o Francisco “The Truth K” Costa. Quando ele respondeu ao “Vgeta31”, assumindo ser dos Diabos Vermelhos, pareceu-me que já o conhecia de algum lado e decidi que tinha ali uma oportunidade de cimentar o edge na mesa. Mandei a boca que o meu nick também tinha a ver com o passado de claques, ele pergunta de que clube sou, eu digo Rio Ave, ele tenta picar-me dizendo que lá só ouvia mulheres gritar, eu rio-me e respondo que não disse que clube era a claque, confundindo-o. Criou-se ali alguma tensão que depressa passou a conexão. O “Vgeta31” tenta roubar-me a bb e eu entendo que é altura de mandar uma mensagem inequívoca. Com A7 não me apetece correr, embora estivesse à frente, por isso foldo virando o Ace para cima. Ele pergunta “para que mostraste o Ás?”, mas o certo é que percebeu o recado e não voltou a tentar a gracinha. Entretanto, o Tacuara sai e chega um novo jogador. Estou na bb, vejo 72 de paus e, pior ainda, ao foldar um jogador virou Q7 por acidente. Ou seja, fiquei logo sem um out. Como as blinds estavam cada vez mais altas, a sb só dá call. Flop nada de especial, mas deixa-me em flush draw com dois paus: ele checka e eu checko atrás. Vem o turn e bate um 7. Ele checka e eu penso com calma. Penso ainda mais, e isso deixou-o desconfiado. Aposto, não aposto? Penso no all-in e decido-me pelo check. Bate 10 de paus no river. O vilão beta 12k. Uma aposta baixa daquelas é mesmo a pedir call. Poderia ter um flush maior do que o meu? Duvido. Bluff? Também não. Penso no straight e só há uma solução: all-in, ele call e quando me vê virar o flush fica estarrecido. Fico a rondar as 100k e numa posição invejável. Infelizmente, já sabia da mesa 8 que, apesar de haver um recorde de participações (252), o payout não seria alargado, mantendo os 20 prémios pré-estabelecidos. Uma pena, pensava eu, que olhava para o ecrã gigante e via como o número de jogadores ia baixando dos 70, 60, 50, 40... a noite avançava para 1 da manhã, 2 da manhã e eu ali. Vivinho da silva. Incrível. Com as blinds a 8/16k e antes de 2k tornou-se quase impossível jogar. Era mesmo all-in or fold, dado que cada órbita consumia 44 mil fichas. Fiz pressão para me manter à tona, algumas das vezes sobre o “The Truth K”. Teve de ser. Isto perante centenas de pessoas que estavam ali à volta, dado que a mesa 1 ficava logo na entrada, comentando cada jogada e criando um cenário arrepiante para quem não tinha experiência prévia destas andanças. De repento, o ITM começa a estar à mão de semear e a parecer possível. A bb está quase a chegar até mim e, com 65k, sinto-me um bocado asfixiado, até que sabemos de um triplo all-in na mesa ao lado. A situação resolve-se favoravelmente e estou dentro do payout. Como é possível, amigos, como é possível, pensava eu para os meus botões. Que estreia de sonho. Saí dali em regozijo, com toda a gente a dar-me os parabéns. Não vou esquecer o esgar e polegar levantado do Jomané quando, com apenas 4 mesas em jogo, ele viu que eu ainda estava em acção. Memorável. Fizemos as entrevistas para o Futsábado e toca a ir descansar o que fosse possível, dado que só adormeci às 6 da madrugada. Infelizmente, logo aí apercebo-me de um grave contratempo ao entrar na net: não fiquei colocado na mesma mesa, onde tinha 4 stacks inferiores à minha e mais 2 pouco maiores, mas tinha sido mudado para a mesa das stacks monstruosas. Ou seja, tinha tudo para ser devorado, mas enfim, o Torneio estava ganho e não podia reclamar. Como fiquei sem bateria a meio da tarde, liguei finalmente o telemóvel no carro, a caminho de casa, e vejo as várias chamadas não-atendidas, algumas mensagens, e sei que o Nuno “Sapetodos” Barbosa mandou uma sms a meio da tarde a perguntar se já estávamos na esplanada...
Domingo, 5 de Outubro
Etapa 9 da Solverde Season-Dia 2
Mesa Preta, posição 7
Cheguei a Espinho pelas 13h30 e no restaurante do costume já me aguardavam o RugbyWolf, Petruzzi, Aliv3 e M1uda. Paguei o almoço e tomei nota de algumas indicações do Hugo sobre o chip leader da minha mesa, o Tiago “Addict”, um jogador com grande futuro e cujas intervenções no Fórum de Estratégia do Pokerpt são de elevado calibre. Vamos para o Casino, entro na sala e sento-me ao lado do Tony Lemos, dos Santamaria. Já levava o discurso preparado, dizendo-lhe que ia ser como os coros da “Falésia do Amor”, ou seja “Here we go, here we go”. Ele acha piada. A acção começa e, da mesa ao lado, vejo sair o já meu amigo Francisco Costa. Nunca pensei, mas é póquer. O Fernando Festas, profissional da Everest, também cai. Como as blinds desceram 2 níveis, já dava para respirar e decidi voltar a ser paciente. Lembro-me do momento em que vi a Angélica no rail, certamente a torcer pela Laura "Luar" Souto das Nutsbusters, e lhe disse com os lábios: “Vai bater”, erguendo ligeiramente o punho esquerdo. Certinho. Logo a seguir, vem AA. Addict faz raise para 18k, João Sobrinho re-raise para 35k. Perante este cenário, peço para pensar se arrisco o call, mas opto por isolar um oponente e faço re-raise all-in de 57k. Quando cheguei à mesa dirigi o foco psicológico para o Addict e voltei a fazê-lo dizendo que esperava o call dele e o fold do Sobrinho, quando o cenário óbvio era o inverso. Addict fold e Sobrinho call com...KK. Ganho a corrida e o direito a sonhar. Pouco depois, penso na bb e foldo 77 virando as cartas, para que todos percebessem que quando fosse a jogo era a sério e que estava a largar pares baixos. Isto tentando também usar a meu favor as indicações que o “Vgeta31” tinha andado a dar sobre o meu jogo a outros elementos da minha mesa. Foldo 99 sem posição e, quando vem 88 e folds até mim, nem duvido: all-in. Laura Souto dá-me call com KQ. Porém, sabia que o par ia aguentar-se. Assim foi. Dou um salto quanto bate um 8 no river e sinto que a final table é mesmo possível. Com cada vez menos gente em jogo recebo QQ na pressão da bolha. O Addict raisa e eu penso para pensar. Podia jogar ali o meu torneio, dado que certamente ele teria alguma overcard. Porém, digo-lhe: “Tiago, se fosse só para tentar chegar à final table se calhar foldava, mas se quiser fazer alguma coisa neste Solverde tenho de jogar e vou all-in”. O susto chega quando o senhor Joaquim Magalhães, com posição sobre mim, começa a pensar, irrequieto. Percebi que estava forte, fico preocupado, mas afinal foldou. O Tiago faz o mesmo. Mostro o QQ e o senhor Magalhães e os seus apoiantes nem acreditam: foldou QQ também. É póquer. Com a fase da bolha em curso há um all-in na outra mesa sem efeitos. Outro all-in e o Davidoff é eliminado. Até me vêm as lágrimas aos olhos. Eu, o Hooligato das mesas de 1 dólar da Bwin, na final table de um Solverde. Só podia estar tudo doido.
Mesa Final, posição 10
São sorteados os lugares da mesa final e fico na posição 10. Gosto porque fico de frente para quase todos os jogadores, o que era bom para as minhas leituras. Só não via o Addict, mas dele sabia o que esperar, por isso estava tranquilo. Com 151k, tinha duas stacks bem atrás e podia aguentar firme e pensar em subir alguns lugares. Sai o Joaquim “JJBluffer” Dias, logo a seguir tomba o Sérgio “Vgeta31” Almeida. O José Correia fica em 8º e eu continuo ali, com o espanhol também short ao meu lado. Xavier Rodriguez finalmente sai. Olho para o monitor de um computador que estava ao lado e vejo que 1.800 euros já não escapam. Show de bola. Tou na sb com 55k e todos foldam até mim. Ao melhor estilo dos nossos Circos e Copas, vou para cima do Addict com KT offsuit. Ele calla com 34, batem dois Tens na board e dou o salto para as 140 mil. Uma órbita volvida, cenário idêntico. Com A2 copas, viro-me para o Addict e pergunto: vamos correr? Ele responde afirmativamente, dá call ao all-in, bate Ace no flop e Queen no turn, confirmando o river mais um double up para as 200 mil fichas. O problema é que a pressão das blinds e das antes era enorme, pelo que bastava passar uma órbita e ficava logo short outra vez. O senhor Joaquim Magalhães, com as suas Galinhas a mandar energia positiva, começa a dominar a mesa e eu assumo que estou a torcer por ele. É uma personagem única, que não está identificada com os detalhes e teorias do póquer, mas que através do instinto faz milagres. Laura Souto sai com K8 vs K6 do Addict onde bateu uma sena e vamos para mais um intervalo. Imaginem, estava nos últimos 5. Vem então uma jogada polémica: estou na bb com 74 ouros e o senhor Magalhães dá call na sb. Batem dois ouros na board. Ele checka e eu nem hesito: all-in e viro imediatamente as cartas antes dele tomar a sua decisão. Um movimento incorrecto, mas sobretudo um erro de “rookie” com adrenalina a bombar. Os outros jogadores pressionam para o call do chip leader mas eu aviso que tenho 10 cartas para o flush (eram 9 mas convinha usar um número redondo... na verdade tinha 15 outs porque qualquer par me daria o triunfo na mão). Joaquim Magalhães tinha cartas baixas, creio que Tx, e pergunta-se se quero continuar a jogar. Eu respondo que sim e ele folda para revolta dos outros jogadores. O facto é que me lembrei do flush de paus e senti que ia bater. Em caso de call, podia sair, mas também podia ter dado um salto enorme. Tinha bastantes outs, é um facto. Como o senhor Magalhães também tinha feito algumas jogadas menos ortodoxas, falando fora de vez e mostrando o jogo, o Jomané reuniu connosco a seguir ao intervalo e avisou que teria de aplicar sanções de as coisas não entrassem nos eixos. Veio então o erro mais grave que cometi no Solverde. O Nuno Cabete tinha as cartas atrás da stack e eu pensei que estava na mão somente com o Addict. Faço all-in com KJ, ele folda e penso que ganhei, lançando as cartas para o muck, quando o Cabete diz que ainda tinha de falar. Podia ter sido eliminado ali, por um erro estúpido, mas o Jomané decide que apenas perdia a big blind. Fico com stack danificada e, logo a seguir, agarro nas minhas 71 mil fichas e digo: “Com esta stack, só posso ir all-in”. Eles pensam que estou em tilt e graças a isso levo calls do Addict e do Tony Lemos. Todavia, ao contrário do que era comentado na sala, eu vi que tinha... QQ. Bate logo outra Queen na board mas eu fico como uma estátua. Eles checkam-se até ao final e espero até eles virarem as cartas e só então bato com as Raínhas na mesa perante um enorme bruá na sala. O Tony Lemos põe as mãos na cabeça, mas o meu triple up estava consumado. O Addict sai, ficámos 4 e, após raise do Tony, eu faço re-raise all-in com AK suited. Ele vira K7 e eu salto para as... 400 mil fichas. O Nuno Cabete tomba e vejo que estamos 3 handed. Quase apetecia beliscar-me. Entretanto, troquei palavras com a Filipa Lemos, dos Santamaria, e o Miguel do duo Miguel&André também veio falar comigo. Já numa fase em que os apoiantes do senhor Magalhães também estavam do meu lado. Sentia que o vencedor ia ser o “Homem das Galinhas”, mas restava-me uma esperança: ir ao Heads-Up com o Tony Lemos, que tinha perdido dois satélites na Betfair na última semana partindo muito à frente. Era o adversário ideal para me dar “calls à jogador”. Ganhando a primeira corrida, depois ia jogar tudo na vertente psicológica. É então que Tony vai all-in no flop com AK com 89Q na mesa. O senhor Magalhães dá um call incrível e vira... AJ. Pois, só que bate um Ten no flop que lhe dá straight. ”Do outro mundo”, foi a expressão que deixei escapar. De repente, estou Heads-Up, e da quase ausência de agressão mútua anterior, vejo que chega a altura de tentar alguma coisa. Tenho algum jogo, pressiono, mas nunca tenho call para a corrida que procurava, o que não teria ocorrido se fosse o Tony Lemos a chegar à final. Quando o senhor Magalhães raisa, eu foldo, isto já com o Sporting-FC Porto a decorrer e a provocar enorme algazarra. Dada a enorme diferença de stacks, decido que com qualquer figura suited ia correr. Vem K3, olino e levo finalmente um call. O senhor Magalhães vira 66. O turn dá-me um King e o nosso abraço é espontâneo. Até que vem o river e bate um... 6. Incrível. Foi mesmo um “Grand Finale” para a Etapa 9 da Solverde Season. Ganhou quem tinha de ganhar, quem mais merecia, e o meu título de Vice-Campeão também soube a triunfo, até porque deu um bónus de 5,5k euros que sabe sempre a pato. Ligo o telemóvel e recebo 34 sms. Imagino o que as teclas F5 não sofreram ao longo da tarde. Sabia que estava muita gente a torcer por mim mas, acreditem, ninguém ficou mais surpreendido do que eu com este feito que me deixou fisica e mentalmente exausto.
Epílogo
Durante o torneio, quando ia avançando, só me lembrava do LostLucky no EPT de Varsóvia e do Anorthosis na Liga dos Campeões. Os milagres acontecem. Conquistado o vice-campeonato, não sei se poderei dizer como o José Mourinho: “Inesquecível, mas não irrepetível”. O futuro o dirá. A verdade é que não tenho sequer o hábito de jogar MTT's e de repente vi-me a "pokeralhar" durante mais de 13 horas consecutivas no primeiro dia e mais 6 ou 7 no domingo. De loucos. O prémio obtido deve dar-me entrada gratuita para o Main Event da Solverde Season, em Dezembro, e antes disso dificilmente vou poder voltar a actuar, dado que o regime de folgas não o permite. Todo o esforço que fiz ao longo de 1 ano para ganhar bases no póquer foi essencial para poder apreender e assimilar ensinamentos incríveis neste Solverde. Se não for esta temporada, em 2009 espero ver o Team FutPoker devidamente equipado e com 5 ou 6 elementos a competir em Espinho, Estoril ou Vilamoura. O meu sucesso é também um sintoma da revolta dos “micro stakers”. Nós somos a base do póquer e podemos ter uma palavra a dizer mesmo nos areópagos da modalidade. Basta acreditarmos. Por último, trouxe de Espinho uma revista Poker Europa onde um artigo do Roberto “Oversleep” Machado, profissional português da Betfair, diz em apenas um parágrafo aquilo que considero ter sido o mote para o meu sucesso em Espinho: “Características como agressividade, jogar para ganhar sem medo, não ter problemas em meter todas as fichas na mesa, paciência, obrigar os seus adversários a fazer fold ou jogar os jogadores são bons prenúncios para atingires muitas vezes os lugares cimeiros em torneios”. Deus te ouça. De facto foi uma actuação quase perfeita, na qual muito muito, muito paciente, fiz boas leituras, fui agressivo e oportuno a pushar e só levei uma "bad beat", a dos Ases, porque a do Heads-Up para mim nem conta. Fizesse eu o que fizesse, o senhor Joaquim e as suas Galinhas iam levar o ceptro. Obrigado uma vez mais pelo apoio de todos. FutPoker rules!!!