Nos tempos em que, havendo mais analfabetos, os que o não eram liam muito, sobretudo jornais, o Burgo mantinha uma tradição de periódicos exemplar. Raul Matos Fernandes recensearia, entre 1896 e 1925, 355 jornais, deixando de fora as revistas. isto em 30 anos é espantoso e dá boa imagem do dinamismo cívico da cidade!
Afirmando uma das predilecções dos portuenses, neste período seriam publicados os seguintes periódicos desportivos "A Mariposa" (1899); "O Campeão" (1900); "Folha de Sport" (1914); Teatro e Sport" (1917); "Porto Sportivo" (órgão do FCPorto, 1918); "Invicta Sport" (1921); "Janeiro Desportivo" (1923). Em 1926 surgia o "O Desportivo", de que mão amiga me fez chegar o nº 6. Como subtítulo apresentava o programa editorial: "Semanário de Cultura Física e Educação Integral" e tinha como director o dr. Vilas-Boas Neto, administrador Carlos M. Madeira, redactor-principal Américo Marinho e chefe de redacção Roberto Machado, além de sete redactores, três fotógrafos e dois caricaturistas (um era Cruz Caldas). E -pasme-se - a redacção e administração era na Rua do Sol, 214 - 1º.
Não desmentindo o significado da imprensa para a análise da sociedade do seu tempo, o conteúdo do jornal explicava-se, através de caricaturas como "De um pobre enfezado, com o tennis, a natação, a esgrima, a corrida,a bicicleta. O boxing, a equitação, o foot-ball, etc... pode fazer-se um homem perfeito"!
Depois, vinha o elogio do dr. Augusto Filipe Simões, da Universidade de Coimbra, que, em 1872, publicara a obra "Educação Física".
E comentava o jornal "Ainda hoje a sua reedição seria oportuna (...) Mas fixemos ao menos o nome do autor, para que não se julgue que em Portugal só se fala em educação física desde que se anda aos pontapés às bolas nos campos de foot-ball".
Não obstante, o futebol ocupava lugar de revelo no corpo da edição e, como é hábito, maledicência e intrigas impregnavam as lides.
Não admira que a redacção afirmasse "Nos mentideros dos cafés, onde a má língua fervilha e o disparate pulula, alguém propalou que 'O Desporto' se fez em oposição ao Foot-Ball Clube do Porto. A atoarda não tem pés nem cabeça".
No capítulo futebolístico, o jornal noticiava desafios entre colectividades hoje inimagináveis. Assim, para o Campeonato da A.F. Porto, o "Marinho" vencera o "União da Foz" (5-0), enquanto em Gaia, no Campo do Cruz de Cristo dos Carvalhos, o grupo da casa vencera o Castelo (9-1) e o Avintes ganhara ao F.C. Gaia por falta de comparência. Mais anunciava que só daria o relato-crítico do jogo F.C. Porto-Progresso (para a Taça Vitória) "no próximo número", pela impossibilidade de o comporem, dado tratar-se da noite de Carnaval.
Vemos ainda que a Associação Académica de Coimbra empatara com o Salgueiros e que "no próximo dia 21 do corrente, a convite ido S.C. Salgueiros, joga no campo do Covelo este magnífico grupo do Minho". (o S.C. Vianenese. Também se anunciava o "IV Porto-Braga" entre selecções, em desafio a realizar no Campo do Sporting "à Rua do Raio".
Mas o prato do dia era preenchido com os ecos do XXI Porto-Lisboa em foot-ball" que desencadeara as reacções dos escribas do Terreiro do Paço, incomodados pela vitória portuense Lisboa levantou tanta celeuma, tanta discussão e isso compreende-se pelas várias circunstâncias que o antecederam.
O despeito tem as suas consequências funestas quando posto ao vivo, sem respeito nem cortesia. Nós, os portuenses, temos, apesar de tudo, uma satisfação ganhámos por 2-1, com público "frigidíssimo" e isso nos orgulha sobremaneira".
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